quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Sebastião da Gama

À pouco tempo desloquei-me até Azeitão, ao Museu Sebastião da Gama, com uma colega de trabalho. Tinhamos como objectivo reunirmo-nos com uma outra colega, a fim de percebermos que trabalhos de restauro eram necessário em documentos gráficos. Esta visita foi para mim uma surpresa....
Entrámos no museu, fizeram-se as apresentações, e a colega com quem me tinha deslocado mostrou-me a exposição do poeta. Fiquei fascinada com o rico espólio que se encontrava (e encontra-se) exposto. Este espólio foi doado pela viúva, ainda viva, do poeta.
As paredes encontram-se forradas com fotos, frases e poemas do autor... Fiquei de tal forma fascinada que quando me lembrei o que lá tinha ido fazer as minhas colegas já estavam a terminar a reunião: )
Durante este dia, e nos dias a seguir, questionei-me como seria possivel eu não conhecer este poeta fantástico da minha terra. Ainda por cima gostando eu tanto de poesia.
Andarei eu completamente distraída? Ou será que nas nossas escolas só se estudam os grandes autores, esquecendo os artistas que marcaram a historia da nossa cidade??
Bom, aproveito para vos deixar alguns poemas do autor e alguma bibliografia, aproveitando assim para vos dar a conhecer o "poeta da arrábida", tal como é conhecido!

O poeta da Arrábida morreu jovem, mas teve tempo para dar voz à Serra, ao mar e aos homens que deles vivem. Foi há 53 anos, mas a obra de Sebastião da Gama, autor de um Pequeno Poema, não está ainda esquecida.


PEQUENO POEMA

Quando eu nasci,
ficou tudo como estava.

Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.

Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.

As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...

Pra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...


Sebastião Artur Cardoso da Gama nasce em Vila Nogueira de Azeitão, a 10 de Abril de 1924. Logo aos 14 anos é-lhe diagnosticada a tuberculose óssea que haveria de lhe custar a vida. A conselho do médico, muda-se com a mãe para a Serra da Arrábida, cenário de sonho que será o “primeiro amor” da sua poesia.
Tal como Alexandre Herculano antes de si, o jovem Sebastião não se cansa de cantar a Serra: em Serra Mãe, Loas a Nossa Senhora da Arrábida e Cabo da Boa Esperança, os caminhos mais recônditos e as gentes da Serra são personagens principais.

Para além da Arrábida, é o mar que encanta o jovem Sebastião, a quem a doença e o isolamento parecem não retirar alegria, vivacidade e facilidade de relacionamento com as pessoas. Como com os pescadores e lavradores, a quem admirava o linguajar.

O início da década de 50 parece promissor para o poeta: em 1951 casa com a amiga de adolescência e vizinha Joana Luísa, na Capela da Arrábida, e nesse mesmo ano publica o quarto volume de poesia, Campo Aberto.
No ano seguinte, no entanto, o seu estado de saúde, que sempre fora débil, agrava-se e Sebastião é internado em Lisboa. Sete meses após o casamento, e aos 27 anos de idade, o autor de Pequeno Poema morre vítima de uma meningite renal.

Joana Luísa empenha-se, após a morte do marido, na publicação dos seus inéditos. É assim que, postumamente, são lançados Pelo Sonho é que Vamos, Diário, O Segredo é Amar e Itinerário Paralelo.
Em 1999, Vila Nogueira de Azeitão passou a acolher o museu onde se reúnem o espólio artístico e alguns objectos pessoais de um dos mais queridos filhos da terra.

Apesar de ser um poeta modestamente reconhecido, são bastante populares o Pequeno Poema e Pelo Sonho é que Vamos. Poeta popular sem ser “popularucho”, Sebastião da Gama não se inseriu em nenhuma corrente literária em particular. A sua rima fácil, o verso fluído e as imagens luminosas fazem dele um autor a não esquecer, ainda que sobre a sua morte já tenham passado 53 anos.



O SOL JÁ SE ESCONDEU...

O sol já se escondeu...
Precisamente quando,
feliz,
eu desatei a cantar.
(Só por feliz eu cantei).

Agora quero acabar,
que já me dói a garganta
mas vou ainda cantando,
temendo
dar por mim de novo triste
assim que esteja calado
(...Como se a minha Alegria
nascesse de eu ter cantado).

in Serra-Mãe



O SONHO

Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos,
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

- Partimos. Vamos. Somos.


in Pelo sonho é que vamos

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